sexta-feira, 16 maio, 2025

Coluna Matheus Alvarenga | Da liberdade à censura: os militares e o nascimento autoritário da República Brasileira

O golpe de 15 de novembro de 1889, liderado por setores militares insatisfeitos com o Império, derrubou uma monarquia constitucional marcada por práticas políticas relativamente liberais, especialmente no que diz respeito à liberdade de imprensa. A nova forma de governo republicano, entretanto, não ampliou essas garantias — ao contrário, impôs censura, perseguições e silenciou vozes críticas, mesmo entre os próprios republicanos.
Durante o Império, o poder militar estava submetido à autoridade civil e à figura do imperador. A legislação proibia, por exemplo, a reunião de oficiais sem autorização. Contudo, a Guerra do Paraguai (1864–1870) modificou o papel das Forças Armadas na vida nacional. A experiência de combate estimulou entre os oficiais a percepção de que deveriam ter protagonismo político. Sob forte influência do positivismo, começaram a se organizar como uma contra-elite, ideológica e institucionalmente articulada.
Essa organização ganhou forma nos clubes militares, como o Clube Naval (1884) e o Clube Militar (1887), que se tornaram centros ativos de crítica ao governo imperial e preparação para a ruptura. O golpe de 1889, comandado por Deodoro da Fonseca, consolidou esse projeto.
Mas o novo governo não se mostrou tolerante às divergências. Em dezembro daquele mesmo ano, o chamado Decreto 85-A — apelidado de “Decreto-Rolha” — restringiu severamente a liberdade de imprensa. Qualquer crítica era interpretada como conspiração, e os opositores passaram a ser julgados por tribunais militares. A censura não poupou nem os próprios aliados.
É o caso do jornalista Pedro Tavares, campista e redator do jornal A República, de Campos dos Goytacazes. Embora republicano convicto, Tavares foi preso por artigos que desagradaram o governo militar. Sua detenção evidenciou que a repressão não visava apenas monarquistas — ela era dirigida a qualquer voz independente.
No Rio Grande do Sul, o quadro era ainda mais grave. O jornalista Carlos von Koseritz, respeitado por sua atuação na imprensa e defensor da monarquia, foi cercado e vigiado pela polícia até sua morte. Mário de Artagão, outro intelectual crítico, foi perseguido e precisou se exilar em Portugal, abandonando o jornalismo político.
Enquanto o Império permitia uma imprensa plural e debates públicos vigorosos, a Primeira República nasceu restringindo justamente esses espaços. O poder militar, agora no centro da política, passou a reprimir abertamente a dissidência — mesmo que isso significasse sufocar seus próprios apoiadores.
Esses episódios demonstram que a mudança de forma de governo não trouxe, como se esperava, maior liberdade. Pelo contrário: a nova ordem instaurada pelos militares impôs retrocessos institucionais e consolidou um modelo autoritário que marcaria a trajetória da República brasileira nas décadas seguintes.
Matheus Alvarenga Gonçalves é pesquisador e acadêmico do 7° período do curso de História da Universidade Federal Fluminense, onde se dedica ao estudo da História do Brasil Imperial. Além disso, é formado como Técnico em Segurança do Trabalho desde 2020, atuando na área de segurança ocupacional.

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